quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Xaxado mostra tradição e resistência em encontro em Serra Talhada

Fundação Cultural Cabras de Lampião/Foto: Divulgação
O pau que batia o feijão para retirar da vagem o caroço, após a colheita, fez surgir o ritmo. Da prática (xaxar), veio o nome. E com o tempo, fez-se dança. O xaxado possui hoje um festival só seu, que já está em sua 13ª edição. Ele é realizado em Pernambuco em Serra Talhada, Sertão do Pajeú - cidade que já foi conhecida como Vila Bella, e local no qual o bando de Lampião teria difundido o ritmo.

Essas são algumas das versões históricas, mas fato é que o 13º Encontro Nordestino de Xaxado começa hoje e segue até o próximo domingo, em múltiplos polos da cidade sertaneja.

Num grupo que era formado só por homens, vivendo entre fugas e combates, é compreensível saber que mulheres não dançassem o xaxado. As espingardas, fiéis companheiras dos cangaceiros, faziam as vezes de damas, seguindo ao lado dos homens, durante o arrastar de passos.

A exclusão feminina permanece apenas nos nomes dos grupos mais antigos, como Cabras de Lampião e Herdeiros do Xaxado. Apenas. Pois quem preside esse bando todo é, sim senhora, uma mulher. Cleonice Maria dirige e coreografa e espetáculo, que é o mesmo desde 1995.



“O espetáculo dos Cabras de Lampião nunca foi mudado. Porém, periodicamente, apresentamos o maior espetáculo ao ar livre dos sertões brasileiro, 'O Massacre de Angico - a Morte de Lampião'”, afirma. 

“Como em qualquer outra montagem cênica, os dançarinos sugerem e ajudam na criação das coreografias. Na verdade, as coreografias estão prontas há vinte e três anos. Apenas alguns retoques são dados quando aparece uma ideia interessante”, complementa. No que se refere ao figurino, a mudança é recorrente, sem perder a originalidade e autenticidade de como os cangaceiros se vestiam.

O evento conta ainda com oficinas de dança, palestras sobre patrimônio, feira de artesanato da região, mostra de comedoria sertaneja, apresentações musicais, passeio turístico ecológico ao Sítio Passagem das Pedras (onde nasceu Lampião) e à Fazenda Pedreira (do primeiro inimigo de Lampião, Zé Saturnino) e o Baile Perfumado, uma festa no Clube da Fazenda São Miguel, com o forrozeiro Assisão.

O encontro é um grande divulgador da cultura nordestina e conta com incentivo do Funcultura/Fundarpe, Secretaria de Cultura e Governo do Estado.
Mas, em Serra Talhada, o xaxado não é tema só uma vez ao ano.

“Costumo dizer que o xaxado começa cedo em Serra Talhada, a nossa cultura por ele já vem enraizada em nosso povo. Temos grupos formados apenas por crianças, os Herdeiros do Xaxado. Frequentemente, os pais procuram o Museu do Cangaço (nossa sede) para matricular as crianças que ficam aperreando em casa, querendo dançar xaxado. As aulas são semanais e gratuitas”, revela Cleonice.


No momento em que a vida parece ser regida pela pressa, ressalta-se a palavra-chave: encontro. “Hoje, mais do que nunca, é necessário fazer eventos como o Encontro Nordestino de Xaxado, pois é uma celebração à cultura e às raízes. A internet e a hiperconectividade podem ser aliadas na projeção dessas manifestações. É uma questão de saber utilizar essas ferramentas”, opina.
A distância é, para os grupos, o menor dos problemas no entender de Cleonice. 



“Nos comunicamos quase que diariamente com os grupos, com produtores e pessoas ligadas à cultura popular. A maioria dos grupos que chegam a Serra Talhada são realizadores de eventos similares, que promovem encontros de bois, de cultura popular, de teatro, de tal forma que o Encontro Nordestino de Xaxado é um momento de trocas de experiências e vivências”, explica.

Outra marca de resistência é o caráter não competitivo do evento. “Nunca participamos de festivais competitivos, nem promovemos. Entendemos que temos é que celebrar a cultura, não criar campo de disputas”, diz Cleonice.


Por: Juliana Almeida, Folha de Pernambuco

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