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A primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, perdeu a disputa interna no Palácio do Planalto e ficou sem cargo oficial na estrutura do governo, mas se mantém como uma das conselheiras mais influentes do presidente Lula (PT) nos sete primeiros meses do governo petista.
Apesar de despachar diariamente ao lado do chefe do Executivo, a atuação de Janja é cercada pela falta de transparência. Além de a legislação em torno do posto de primeira-dama ser vaga, ela, sem a titularidade de um cargo, não tem obrigações nem deveres formais, como a publicação de uma agenda pública. Ela também não costuma dar entrevistas à imprensa.
Janja atua como uma espécie de "algoritmo" de Lula -apelido que foi dado a ela por alguns ministros da Esplanada. Ele não usa celular e é pouco ligado à instantaneidade do noticiário atual, mas recebe informações da socióloga, que participa diretamente das reações do mandatário aos acontecimentos no Brasil e no mundo.
A primeira-dama acompanha diariamente os debates da internet e mede a temperatura da percepção das pessoas em relação às medidas do governo. É pelas redes que ela também compartilha registros de compromissos e eventos dos quais participa.
A avaliação de Janja sobre os temas em debate no país é levada em consideração por Lula em todas as áreas, da política à economia, o que gera incômodo em auxiliares do presidente.
O episódio que ficou mais conhecido foi o recuo do mandatário, após pressão dela, para retomar a isenção nas remessas internacionais de até US$ 50 de pessoa física para pessoa física.
A primeira-dama foi procurada pela reportagem, por meio de sua assessoria de imprensa, mas não respondeu.
No último mês, Janja retomou o projeto de lives "Papo de Respeito", no qual convida autoridades e personalidades para tratar de temas diversos e políticas do Executivo, após ter sofrido críticas pela transmissão ter sido divulgada em canais oficiais do governo.
Ela já fez lives ao lado de ministros como Fernando Haddad (Fazenda), para tratar do Desenrola Brasil, Margareth Menezes (Cultura), sobre a Lei Paulo Gustavo, e Cida Gonçalves (Mulheres), sobre o enfrentamento da violência contra a mulher.
Na próxima semana deverá conversar com Nísia Trindade (Saúde). Uma live com Marina Silva (Meio Ambiente) também está nos planos da primeira-dama.
Janja também está acompanhando as possíveis trocas que Lula fará na Esplanada, em meio à pressão de PP e Republicanos para entrar no governo. Ela chegou a publicar um vídeo ao lado do ministro Wellington Dias (Desenvolvimento Social), cuja pasta é almejada pelo centrão.
Na gravação, ela afirmou que a pasta, que cuida do Bolsa Família, é o "coração do governo". Janja é correligionária, ou, como se descreve nas redes sociais, "petista de carteirinha".
A socióloga foi uma das responsáveis por alertar Lula sobre o risco à sua imagem que a demissão de ministras mulheres pode causar.
O petista cogitou alocar representantes do PP e do Republicanos nos ministérios de Ciência e Tecnologia, chefiado por Luciana Santos, e do Esporte, de Ana Moser, e na presidência da Caixa Econômica Federal, ocupada por Rita Serrano.
No entanto, a pressão de Janja e da ala do PT que milita na causa feminina tem pesado na discussão e Lula tem se mostrado receoso com a chance de reduzir a participação de mulheres no governo.
Essa não é a primeira vez que a primeira-dama atua nos bastidores em questões relacionadas ao ministério do petista. Mais recentemente, colaborou para a decisão de Lula em oferecer um cargo ao ex-deputado federal Jean Wyllys (PT) na Secretaria de Comunicação do governo.
Além de questões do governo, Janja também tenta influenciar os rumos internos do PT. Causou incômodo entre dirigentes do partido, por exemplo, a publicação em que chama a presidente da sigla, Gleisi Hoffmann, de "futura senadora".
A foto foi postada em meio a rumores de que o ex-juiz Sergio Moro (União Brasil) pode ter o mandato de senador cassado, o que ensejaria a realização de nova eleição para o posto no Paraná.
Petistas afirmam que a decisão de quem será candidato a senador pelo Paraná nas próximas eleições não cabe a Janja, mas à direção da sigla naquele estado.
Aliados da socióloga a defendem das críticas dizendo que sua forte presença traz uma visão mais moderna para a posição de primeira-dama. Esses aliados também apontam um componente machista nas críticas de que ela estaria se excedendo. Em maio, ela afirmou num evento que sofre misoginia todos os dias.
Além de incômodo, a grande influência da primeira-dama sobre o presidente gera receio de aliados. Em muitos casos, nem os interlocutores mais próximos de Lula têm coragem de levar até o petista questionamentos ou restrições às ideias de Janja.
No início do ano, o governo gastou quase R$ 200 mil na compra de móveis para o Palácio da Alvorada. O desejo de Janja era gastar ainda mais e comprar itens assinados por designers conhecidos, sob o discurso de que não é uma aquisição pessoal e tudo ficará para os próximos presidentes.
O ministro da Casa Civil, Rui Costa, ciente do desgaste que o alto custo das compras poderia gerar, se opôs à ideia. No entanto, quem teve de avisar Lula sobre o problema não foi ele, mas Gilberto Carvalho, ex-chefe de gabinete e amigo de longa data do presidente.
Críticos de Janja no governo afirmam que a foto em que ela aparece entre o petista e o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, registrada na Casa Branca durante encontro em fevereiro, resume a personalidade da primeira-dama, que prefere demonstrar poder e evita o papel que se limite à função de companheira do presidente.
Nas viagens internacionais em que acompanha Lula, ela também tem participado de agendas separadas, como é de praxe em muitos casos de primeiras-damas tradicionais.
Por outro lado, nacionalmente, ela tem agendas com ministros de governo frequentemente -o que, até esta gestão, não ocorria. Nas redes sociais, publicou fotos de agenda com Jader Filho (Cidades), com quem foi tratar sobre moradias no complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, por exemplo.
Apesar de não ter um cargo oficial, Janja tem despachado diariamente de sua sala no terceiro andar do Palácio do Planalto, mesmo piso do gabinete presidencial.
No começo do mandato, o presidente chegou a cogitar nomeá-la para um cargo sem remuneração. Consultados informalmente sobre a viabilidade legal da medida, auxiliares do presidente apresentaram ressalvas à designação de um posto para Janja sob pena de isso ser caracterizado como nepotismo. Por Notícias ao Minuto.
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